quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

CANSEI

CANSEI

              Vera Popoff
Quer saber?
Cansei e me machuquei....
Foram tantos murros na ponta da faca e feri-me.
Tantos pensamentos e ideais desapontados!
Tanta esperança no bom combate!
Tanto sonho ignorado, ruído e perdido .
Desisto da resistência e vou falar das receitas de bolachinhas ,
Poetar a saudade dos meus tantos amores
Comentar sobre as gordinhas e magrinhas.
Como mulher, cantarei a feiúra e a lindeza
Promoverei os produtos de beleza,
máscaras de abacate para a tez macia.
Tratamentos para um cabelo bem artificialmente lisinho .
Botox nos lábios carnudos que já não podem beijar e nem sorrir.
Escolherei modelitos de armas.
Ouvi dizer que tem as coloridas ,
combinando com a roupa do dia.
Depois de alguns disparos
Comungo e rezo a Ave Maria!
Feliz, soltarei muitas bombas e grotescas gritarias.
Dependendo do noticiário da velha e eficaz mídia :
-Hoje foram dez assassinados por motivos diversos como:
-mulher vestia vermelho
-motorista xingou o outro de pentelho
-menino usou camiseta rosa
-garota procurou emprego ao invés de arrumar as gavetas.
Ah...com fatos tão relevantes
Sigo meu plano adiante, saio na dianteira
Na varanda , vou bater muitas panelas.
Viva a minha Pátria altaneira!

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terça-feira, 15 de janeiro de 2019

TUDO VAI MUITO BEM

TUDO VAI MUITO BEM
                                          Vera Popoff

Está tudo bem! Muito bem!
o desempregado sem vintém
sumiu do mapa, graças ao óleo ungido.
E você, bolivariano intrometido,
queixa-se? Do quê?
Do andarilho  buscando o resto, buscando o pão
amanhecido, o filho perdido?

Em nome de Jesus,
As armas estão liberadas!
Que festa nas periferias,
nos guetos, nas terras demarcadas!
Ah... sem embate, sem debate,
Já existem os condenados
            aos lotes!

Não será usada mais
a bala de borracha, o gás de pimenta
Muito branda tal encomenda!
Facada sem sangue é coisa do passado
Decisão festejada pelo alienado!

O estampido não dói no  ouvido
          do homem de bem
          da dama impoluta
          do jovem de berço
          da senhora de fé , rezando
          o seu terço.

Ora , ora, o atingido, caído
será a gente miúda , sem brilho e perfume
manchada com as nódoas da dor.
O reprodutor da barbárie
sorri de contentamento
Bate a continência para o cabo,
o soldado ,  o  capitão , o sargento.
Não importa a patente,
desde que seja a boa gente.

Nos bairros elegantes,
a  grande  manifestação nacional
-Por Deus, diz o senhor bem vestido
-quero o meu bairro de volta!
 Não há na dita  faxina, nenhum mal!
Corpos em farrapos ferem a massa cheirosa,
Deterioram as alamedas
onde  transitam as  pessoas bondosas

Meninos e meninas
desconhecem a nova ordem:
-É o azul ou o rosa
sem discussão e sem prosa!
Encurralados na miséria sem cor,
sem lamento, sem força para externar
           o abandono e a dor.

Está tudo bem! Muito bem!
Na Terra plana, a bíblia vai além
A palavra final  condena a diferença,
não permite tal ofensa, afasta o mal.
Lança os indesejados à escuridão
E haja contribuição!

A vassoura ungida e benzida
Varre a pobreza e blinda a nobreza
O livro sagrado lido e relido
no galho da goiabeira
define quem é a feia e quem é a linda.
Não contentam-se com pouca asneira.
 
Está tudo bem ! Muito bem!
Produção elevada das barbáries
A miséria já encurralada no lugar devido
Os deserdados da civilização
já não gemem...pedem perdão!