ADIANDO
VERA POPOFF
Adiei para o seguinte dia
a minha alegria.
Deixei para apreciar mais tarde
o cheiro inebriante daquele jardim!
Adiei para a próxima noite
a contemplação do céu sobre mim
Do chão eu só lamentava, e chorava
e lamuriava e amargava dores inúteis
Então , debruçada na janela semiaberta,
não enxerguei o luar
Adiei... para momento mais propício,
quando o entusiasmo de viver alcançasse
um sublime início.
Fui adiando a esperança,
Adiando o momento de deliciar-me
com doces lembranças.
Muito a fazer, tanto a correr, hora de tarefar...
O campo das lamentações bem aberto
Recebendo as sementes das aflições,
das mágoas, de tudo, tudo que não foi conquistado.
O inverno chorado, doído, sentido na pele.
Adiei a chegada da minha primavera
Que tola espera! Sem sonhos, sem a germinação
da beleza, do aroma sedutor, do amor.
Adiei o passeio ao mar, a caminhada descalça
com os pés afagando a areia.
Adiei a cócega gostosa da caricia no pescoço
Adiei o beijo com gosto de amora
Não, ainda não era o momento
Esperaria a outra estação , a melhor hora!
Adiei a boa palavra, o sorriso irresistível,
Adiei o carinho, o abraço, a mão estendida
Adiei o momento de abrir o frasco de perfume ,
A estreia do vestido mais bonito,
Adiei a semeadura no quintal estéril
Adiei a colheita , adiei a data perfeita.
Assim vou adiando, adiando...
Adiando o encantamento
O deslumbramento pela vida
Adiando aquele instante de agarrar-me
à vida e simplesmente...viver!
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