A ÚLTIMA CARTA
Vera Popoff
Escrevo-te a última carta
Fora de moda , as cartas seladas, cheia de segredos,
desapareceram...
Quero te contar da minha vida
depois da tua cruel partida
Deixaste-me sem um beijo e...
tive que passar o tormento de relembrar
os tantos outros beijos antigos, molhados, demorados,
tão apaixonados!
Precisei agarrar-me ao penúltimo abraço
O último tu me negaste.
Foste sem um único olhar ...para trás
Se tivesses virado e me olhado
não terias partido.
Terias visto a mulher que abandonavas, ali.
Tão cheia de amor , carente e como árvore ,
pendendo frutos de desejo e de carinho
Disposta a ser a tua gueixa, a tua escrava,
aos teus pés!
Foste sem saber que o meu amor era louco,
único, perfeito, incondicional, disposto e perene
como um carvalho.
Depois da tua partida fiquei perdida
Perambulei por causas doidas, entreguei-me
às lutas , que até então , nunca foram as minhas.
Até ali, minha luta era prender-te, agarrar-me ao teu corpo
Beijar-te inteiro, dos pés aos teus cabelos.
Deixaste-me...perdida.
Agarrei-me aos sonhos de liberdade
Distanciei-me de outros homens
Tomei dianteiras perigosas,
enfrentei o risco de tortura e morte
Sabes por quê?
Já não queria ver outro sol nascer,
longe de ti.
E sentia repulsa pelo abandono e a ingratidão,
apesar dos amores nunca serem gratos
Mas eu vivi, meu amor!
Sem ti! Acreditas ? Vivi e fui bonita
Vivi e amei outra vez
Vivi e mudei, transformei algumas vidas...até!
Fui desejada por outros homens e amada
Conheci beijos mais lascivos que os teus beijos
E prazeres , até mundanos, mas tão quentes !
Fiz coisa que desconheces
Conheci territórios íntimos que desconhecia
Entrei dentro de mim e desbravei-me.
Hoje, assim como sou, não me quererias
Sou cheia de vontades e sabedorias
Amparei-me no estudo da filosofia
Aprendi que o amor só vale a pena
quando também é amado.
Vi a tua figura pelas vias sociais
Senti pena...
Sem mim ficaste tão plural e tão sem graça!
Teu olhar parece fosco e teus lábios, acho,
sem o sabor do vinho daquela taça.
Falas de coisas pequenas e erras as concordâncias
que estudávamos juntos.
Achei o tua retórica limitada e atrasada
Não discutes a ética, a desigualdade, viraste para a direita
Ah...eu pouco perdi, sem ti
Mas tu? pobre homem vazio!
Perdeste muito, ou quase tudo, sem mim.
Despeço-me e te desejo uma grande remorso!
Mereces todas as ingratidões do mundo
Longe dos meus olhos e da minha amorosa vigilância,
teus dias são insonsos e percebo-te amargurado,
desfigurado e a criatura que hoje, não desejaria
para mim.
Ficarias atônito se me visse , agora!
Emociono-me e sou capaz de enternecimentos ,
Às vezes , confesso-me descontente porque espero sempre
muito mais
Não apenas para mim, mas minha esperança é ampla
e abrangente.
Tive perdas bem maiores do que a sentida
quando te perdi,
Mas estou aqui! Se restou saudade,
distante , bem distante , tornou-se névoa.
Enfim, nos perdemos, mas reencontrei-me
Já, tu, homem fugaz...no teu castelo
é um ser perdido e empobrecido.
Toda a mágoa do mundo carregas nos teus fracos ombros.
Sem mais e atenciosamente...Eu!
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