terça-feira, 23 de abril de 2019

DESFILE

DESFILE
                       Vera Popoff

Por que desfilas o mesmo olhar
     sempre, sempre ,
sobre os mesmos horizontes?
Por que não buscas uma nova fonte?

Por que a tua vida não avança
   e segue tão primitiva?
Teimas na mesma andança
     Não te cansas?

Por que não abandonas a tua rotina?
Não oscilas? Não te intimidas
com tanta mesmice ?
Como suportas as próprias esquisitices?

Por que não te obrigas a novos rumos?
Perpetuamente, em torno dos mesmos sonhos,
Navegas nas mesmas águas,
desaguas as mesmas lágrimas?

Por que estás foragida?
Presa no teu  cativeiro, tão  esquecida?
Desfilas nas mesmas passarelas
No rosto, a mesma brisa?

Tropeças nas mesmas pedras, 
Chamas sempre pelo mesmo deus
Sacodes as mesmas penas, das mesmas asas
Sob o mesmo firmamento
O sutil e tímido contentamento?

Num mundo vasto
Não colocas a tua nau para navegar
nos grandes e profundos mares?
Cavalgas nos estreitos campos?

Afinal, qual é o teu segredo?
Sentes algum privado medo?
Sentes as amarras de laços
nunca desamarrados
 e nós jamais desatados?

Ou a tua alma enraizou-se,
na terra da paz?
E desfilas sobre um chão de folhas
e te basta um céu de estrelas,
e as ramas são os braços que te aconchegam?


A natureza enleia-te
Alimenta-te
Esperança-te
Serve-te
Oferece-te um doce ninho.
Contenta-te!










O MORRO DO SABOÓ

 O  MORRO DO SABOÓ
                                    Vera Popoff
...
Habito num estreito vale
entre matas e montanhas,
próximo ao Morro do Saboó
O lugar parece triste para quem avista
E o lugar é mesmo triste para minha vista.
É mais triste ainda para o meu coração.
Meu coração trouxe para cá
um passado nunca esquecido,
uma saudade jamais vencida
E por isso, .aqui entrei chorando.
Permaneci amuada, exausta com as tantas perdas,
desiludida com as partidas.
Cheguei, querendo ir embora,
peregrinar pelo mundo afora!
Fiquei... desejando não ficar
Dias maçantes...um atrás do outro,
sem nada acrescentar à alma, então, vencida!
Nem mesmo a sensação de estar dividida.
Não , não! Sempre inteiramente decidida
a brigar com a vida, ou
a morrer calada,
num Morro que não arquitetei
Tão fora do meu espaço
tão estranho aos meus pedaços.
O Morro do Saboó , avistado lá adiante,
não me aconchegava..
Com a mania de semear
fui semeando sem ilusão, nenhuma ansiedade,
nenhum planejamento, vagarosamente,
para não me aperceber das horas
passando
na mesma cadência
Sementes lançadas, perto e longe.
Com total indiferença pela brotação,
um vazio de contentamento ,
apenas, para passar o insonso tempo.
E teimosamente, tudo foi brotando
Nenhum galho se importando
com a minha tristeza.
Nenhum dos sóis nascidos ,
próximo ao Morro do Saboó,
deixaram de brilhar
com o tanto de desencanto vivido.
O Universo desconhece nossas agonias,
os maus gostos , os desgostos.
O universo rege as suas leis
Independente dos sentimentos humanos
e banais.
O Universo é maiúsculo demais
para os nossos olhos e
para as pequenas
e humanas dores.
E nós somos minúsculos demais
diante de tal grandeza!
E próximo ao Morro do Saboó,
num triste e solitário vale ,
impertinentes mãos remexiam a terra,
cavavam, sem intenção ou inspiração
na brotação.
Jurando a todo momento, não mais insistir,
Blasfemando:
"O Teu jugo não é suave e o Teu fardo
já ão suporto!
Vou sucumbir, sem humildade,
sigo oprimida!"
Ainda passo os meus dias
próximo do Morro do Saboó.
Mas agora, vejo o desabrochar das flores,
os frutos da romanzeira, a voz dos sabiás.
Abraçam-me , os galhos dos manacás.
Nunca espero um amanhã.
Mas regozijo-me , calada,
a cada inesperada manhã!
"-TOMEI SOBRE MIM O TEU SUAVE JUGO
E O TEU FARDO JÁ É MAIS LEVE."

domingo, 21 de abril de 2019

TRAÇANDO MOLDES

TRAÇANDO  MOLDES
                                                  Vera Popoff

Fita métrica e papel,
lápis e caderno de medidas,
traçado na cabeça e dons nas mãos
O modelo escolhido está desenhado
             no coração.

Um modelo sem a grife famosa
Sem a tendência do momento,
Longe do padrão da moda
traçados alinhados e com certo
                     arejamento.

Vestido novo para uma alma surrada,
                desbotada
                desajeitada
                um tanto quanto,
                desencantada.

Um pouco de elegância
para vestir a alma esfarrapada ,
silenciada pela ansiedade de gritar
          com fôlego
          a liberdade!

Um vestido novo, sutil perfume,
Laçarotes e lantejoulas
brilhando os sonhos renovados
           de esperança!

A alma encanta-se com os tons
           sobre tons.
Alegra-se com os reflexos do sol
      raiando sobre as utopias
E sua essência enche-se de suave
              melodia.

Libertou-se do seu cárcere!
Matou a sede e esbanjou prazer
Banhada na cascata de novas ilusões
É  alma andorinha. É alma andorinha!









SOLIDÃO POVOADA

SOLIDÃO POVOADA
                                        Vera Popoff

Solidão Povoada
Vera Popoff
A solidão é ampla.
Tem atalhos que percorro
sempre, sempre ...só.
Tantas vezes, olham-me com dó!
Tolos, tenho a alma povoada
O coração com muitos compartimentos
Onde vivem a saudade boa,
A coragem de viver à toa,
Lembranças tatuadas
Histórias bem e mal contadas
Poucas verdades e mentiras gostosas de ouvir.
"Causos" , muitos causos.
Sou guardadora compulsiva
de causos ouvidos
lidos e relidos, contados pelas
comadres, compadres e padres.
Causos das avós, do pai,
um brilhante contador de causos.
Caminho cedo, quase na madrugada
Encontro pessoas boas
As ruins, mando procurar
aquele mau lugar!
Três bichanos aguardam a comida
Levo na bolsa de pano que carrego
Sem folgar os passos
Um dever do qual o pé, eu não arredo!
O Nego, cão da rua
Enche-me de carinho
Abana o rabinho
E faço-lhe um afago
Dou -lhe grãos de ração ,
sua recompensa
Sistemático, mas livre!
Faz o que quer,
quando quer.
Nos alheios jardins, onde passo
Controlo a floração
Toco as flores com doce olhar
Com receio de as machucar!
Medito. O que é meditar?
Não tive essa aula, mas posso
imaginar
inventar
Intuir
sem falar.
Dou um drible na dor!
Ela leva um chapéu
Uma finta e dá um tempo !
Saio da marcação
e descontraída, memorizo
uma poesia ou canção!
Solidão povoada!
É mesmo, uma solidão arretada.
Joga com as palavras, mas
destrata o conceito e a ideia formada.
Aceita o sim e o não
Tem ojeriza ao talvez!
Talvez, sim?
Talvez, não?
É conversa que fica em cima
de muro.
Mal suporto uma cerca ou porteira
Muros? Só os derrubados.
Alma murada é alma confinada
Não voa, não corre , não viaja
Daí, a solidão perde o encanto
de ser a solidão povoada!

BATE PANELAS

BATE PANELAS
                                Vera Popoff

Panelas não batem contra o derramamento de sangue?
Panelas não batem pela entrega vergonhosa da Amazônia?
Panelas não batem pelo extermínio dos negros , pobres e tombamento dos indígenas?
Panelas imundas, malditas! Batem com ódio e despudor , festejando as crueldades, os preconceitos e as torturas.
Madames e senhores de bem...
Por favor, não digam mais ,AMÉM!
HIPÓCRITAS!

                  

quinta-feira, 11 de abril de 2019

DESISTO

Desisto

              Vera Popoff
Quer saber?
Cansei e me machuquei....
Foram tantos murros na ponta da faca e feri-me.
Tantos pensamentos e ideais desapontados!
Tanta esperança no bom combate!
Tanto sonho ignorado, ruído e perdido .
Desisto da resistência e vou falar das receitas de bolachinhas ,
Poetar a saudade dos meus tantos amores
Comentar sobre as gordinhas e magrinhas.
Como mulher, cantarei a feiúra e a lindeza
Promoverei os produtos de beleza,
máscaras de abacate para a tez macia.
Tratamentos para um cabelo bem artificialmente lisinho .
Botox nos lábios carnudos que já não podem beijar e nem sorrir.
Escolherei modelitos de armas.
Ouvi dizer que tem as coloridas ,
combinando com a roupa do dia.
Depois de alguns disparos
Comungo e rezo a Ave Maria!
Feliz, soltarei muitas bombas e grotescas gritarias.
Dependendo do noticiário da velha e eficaz mídia :
-Hoje foram dez assassinados por motivos diversos como:
-mulher vestia vermelho
-motorista xingou o outro de pentelho
-menino usou camiseta rosa
-garota procurou emprego ao invés de arrumar as gavetas.
Ah...com fatos tão relevantes
Sigo meu plano adiante, saio na dianteira
Na varanda , vou bater muitas panelas.
Viva a minha Pátria altaneira!

NOVE DEDOS E DEZ DEDOS

NOVE DEDOS E DEZ DEDOS

                                                  Vera Popoff
As mãos com nove dedos são capazes
de arquitetar um mundo!...
Desenham a igualdade,
Colorem a dignidade,
Multiplicam os bens da terra
Trazem sonhos aos quem não sonhavam
Protegem as cabeças, do relento
Agigantam-se,
diante do que é raso e tão pequeno!

O algoz , cujas mãos , têm dez dedinhos
inquieta-se com o brilho alheio
Faz da vingança , seu grande anseio.
Tripudia e lhe chama "nine"
Se ri com um riso torto.
Da decência , ele perde o "time"
e afunda-se na mediocridade.
As mãos com seus nove dedos
abraçam a Nação inteira
São capazes de matar a fome, a sede
fazem sorrir tantos semelhantes
Têm sonhos tão delirantes!
O algoz não o perdoa!
Um homem com nove dedos
Corajoso e habilidoso
Vai direto para a masmorra
-que morra!
As mãos,
com seus nove dedos
Tatuaram n'alma, a sua liberdade.
As mãos, com seus dez dedinhos
Aprisionam -se , seguem amarradas
às injustiças , às mentiras , às sentenças
sob delação.
Estão condenadas à escravidão
do infame perdão.

As mãos com seus nove dedos
viram as asas de uma multidão
Sobrevoam a leveza da consciência,
a lucidez , a paciência , a sabedoria
Nelas , a esperança, inda carrega
São cotovias aproximando
o céu azul,
da nossa Terra

SE ME AUSENTO

SE ME AUSENTO

                                     Vera Popoff
Se me ausento é porque
certas atitudes eu não aguento....
É porque não me sento
sobre as indignações
e não me deito sobre os colchões
da injustiça e dos cínicos perdões.

Se me calo é porque quando falo
as palavras não metem -me medo
Eu digo o que sinto,
o que pressinto
e se doeu...doeu.
O que espanta-me
O que aterroriza-me
é a violência , a grande indecência e a
infame traição.
O ultraje, a omissão ,
são parentes ardentes
da infeliz acomodação.
E da hipocrisia, são primos irmãos.
Se tiro o meu time de campo
antes do apito final
Não o faço por covardia,
mas por agonia
Ao ver a bola que rola
sem compromisso com o jogo:
ora sujo, ora desleal, ora faltoso
ou o nó tático simplório, cínico e banal.
Simpática, agradável , risonha
eu sou...
cozinhando, servindo, atendendo,
sendo
solícita e tão dedicada!
Mas se passo do ponto,
debato uma ideia, vou fundo
na convicção...aí não!
Como ela é
radical, antipática, ingrata e dura!

TEXTO DE FERNANDA BORGES KEID

Texto da minha filha Fernanda ao meu irmão Fernando Popoff, seu tio e padrinho.
Há 20 anos vc se foi...
Ali, naquele momento, eu tive a dolorosa lição sobre a brevidade da vida, sobre mortes inexplicáveis, sobre a dura saudade...
A partir daquele dia, fui obrigada a crescer sem você, sem seus conselhos, sem suas lições, sem seu carinho......
A partir daquele dia, cresci à força. Fui obrigada a isso. Inspirada em você.
Seguir sem você foi doloroso. Foi chato. Foi traumático. Doeu. Ainda dói. E muito.
Não há um único dia em que eu não pense em você.
Não há uma única decisão a tomar em que eu não me pergunte o que você me diria...
Tanto já passou. Tanto já vivi. Mas você continua comigo. Todos os dias. Em cada caminho que sigo.
Só quem viveu perto de você consegue dimensionar o exemplo puro e simples de generosidade, de lucidez, de humanidade...
Você foi meu anjo em vida. E sei que ainda é. De onde estiver....
Você foi e é minha inspiração diária. Todas as minhas conquistas, em silêncio, eu lhe dediquei...
Seguimos aqui, neste plano, com a esperança de um dia lhe reencontrar...
Meu tio, meu padrinho, meu amigo, meu norte.
Amo você infinitamente e pra sempre!!!! Saudades!!!!
NÃO SEI !


                                                         Vera Popoff
Tenho perdido o sono, perdido o apetite, perdido o riso e perdido até
a esperança. ...
Tenho perdido a leveza de poetar.
Não sei escrever poesia sobre o sangue derramado e os assassinatos.
Não sei cantarolar um poema sobre cadáveres,
nem sei falar do perfume da rosa sobre o cheiro da pólvora.
Não sei libertar o pensamento,
deixá-lo viajar na brisa , enquanto
as lágrimas rolam e as dores assolam,
num mundo de perdas e horrores.
Não sei abstrair e voar num verso ,
sabendo a terra contaminada do horror.
Não sei encontrar rimas para a violência e para as almas malditas ,
que divertem-se ou justificam,
com desdém,
as tragédias anunciadas.
Então ,no momento, eu só consigo doer...

OUTONO

OUTONO
                                             (Vera Popoff)
Levantei muito cedo!
Só para olhar o nevoeiro do outono
e rir do sol com preguiça!...
Queria ouvir o eco do vento...
que carrega a folha seca
carrega o pó acumulado,
o sentimento velho e cansado,
teimosamente, guardado!

Eu só queria ver o fruto pendido,
caído!
Lambuzar a minha boca do melado
do seu doce,
da energia do seu gosto e
virar criança...outra vez!
Queria assistir a cena da árvore nua,
das folhas caídas na rua!
Descobrir outra ruga no rosto
Desfolhar mais uma rosa e
contar para alguém ,aquela repetida prosa!
Eu só queria olhar, com nostalgia,
mais um outono!
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              QUE CIDADE É ESTA?
 
                                                                  VERA POPOFF
Que cidade é esta?
Em cada esquina, uma igreja....
De cem em cem metros, outra igreja.
É louvação, joelhos ao chão,
É a Bíblia, sempre à mão!
Mil Ave-Marias, hóstias em profusão.
E o pobre tombado ao chão.

Que cidade é esta?
Gente do bem comemorando sinistros?
Buzinaços, festejando o fogo,
queimando a carne do outro?
Uma Nação de tantos supremos e ministros
despudorados
Riem-se para o tal mercado
Confessam os seus pecados
Cultuam os holofotes, como ninguém!
Mas ignoram os seres humanos
sem vintém!
São Paulo virou tragédia
O Brasil, uma tragicomédia
Que cidade é esta?
Crianças alimentadas com carne podre e ração.
Governador e prefeito sambando
e gargalhando
Sobre a desgraça da Nação.
Desprezíveis, debochados!
Que cidade é esta?
A qual espécie pertencem?
Não nasceram de ventres de mães!
Foram cuspido ou vomitados?
Fascistas, cruéis, desprovidos de almas.
São projetos para um estudo
Pesquisa para a ciência
Foram surgidos?
Foram aparecidos?
De qual dejetos foram construídos?
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GRITEMOS E CHOREMOS, ABRAÇADOS

Simplesmente Verinha
 
GRITEMOS E CHOREMOS, ABRAÇADOS!
                                                                                     VERA POPOFF
 
                                  
Como se não bastasse a incapacidade e a leviandade...
Ainda aguentamos a treva da grosseria,
A sujeira ...sem lavanderia
que baste,
para limpar o odor podre e a
nódoa de sangue que nele impregnou!
Ainda aguentamos seus acéfalos e
despreziveis admiradores ,
outros tantos seres dos horrores!

Arminhas e vulgaridades,
Mentiras e mediocridades ,
Culto à morte violenta
Torturas festejadas
Mãos sangrentas, homenageadas.
Brasil! Brasil!
Brincaste de céu e inferno
Caiste na indecência mais perversa!
Desmoronaste sobre um rio de sangue e lama.
Cutuquemos as feridas
para que sangrem
Para que gritemos de horror e dor!
Assim...jamais esqueceremos.
Sim, guardermos o rancor dos tempos, com gosto do medo
e do terror!
A vontade é de gritar a repulsa.
Choremos , sobre a terra manchada da violência e da vergonha
Abraçemos, juntos, uma causa,
que nos liberte da coisa abjeta e bisonha
Procuremos um sinal de luz,
um fio de esperança, um pulsar
d'algum amor
Antes que morramos todos
E deixemos o monstro solto
a causar a" mais grande" desgraça
jogada sobre nós!
Não! Não perdoemos os zumbis,
que lá no topo do inferno, o puseram!
Não amenizemos a catástrofe
Não poupemos as palavras que os definem
Se, idiotas, for vocábulo leve,
recorramos ao dicionário :
- infames, despudorados, vís,
que entregaram às bestas feras,
todos os Brasis!
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AS CHAGAS

Simplesmente Verinha
AS CHAGAS
                Vera Popoff
As malditas chagas foram abertas!
Doem ! Os abscessos purgam!
Expulsemos , rápido , a causa das feridas .
O desastre foi consumado!
O Brasil já está violado....
Sem perdão , aos 57 milhões de algozes!
Busquemos o alívio de tanta dor!
Olhemos nos olhos, uns dos outros!
Quem sabe...acendemos a luz do amor!

AUSENTEI-ME

AUSENTEI-ME
Vera Popoff

...
Ausentei-me do cravo e das rosas
Ausentei-me do sol e da brisa
Ausentei-me da luz e do jardim
Perdi-me dentro de mim!
Ausentei-me da primavera
Ausentei-me do perfume dos lírios
Da visão da janela, ausentei-me.
Fechei as cortinas ...
Debrucei-me sobre meus ombros
O cansaço me desatina
Sou a sombra procurando um corpo

SEGURADA PELOS CIPÓS

Segurada pelos cipós
Vera Popoff
Quando os anéis se foram
Ficaram os dedos......
Era pouca a força para segurar
algum bem material
Eu contava com o bem da vida
Eu contava com a força dos olhares
das filhas,
do desorientado companheiro,
contava com a habilidade das mãos
as linhas, as fitas , os novelos ...
eu lidava bem com os novelos
E cultivava , no coração, um canteiro
de zelos.
Zelo pela família e pela dignidade.
Zelo pela união, zelo pelos dons!

À luta, mulher!
Ficou o teto! Era o grande recomeço!
Ficaram os abraços e carinhos
Ficou o ninho!
Um grande quintal vazio...
sem verde , desabitado de passarinhos
Solo seco , pedras de todos os tamanhos
atravancando os meus caminhos...
Na insegurança, agarrada aos cipós , vagarosamente , desfazia, um a um,
os nós.
A pintura na casa tão velha!
Florinhas mimosas nas molduras
das portas e janelas
A máquina de costura
As linhas , os louvores
Muitos pudores
O chão, a energia, duas meninas
tão fortes! Tão corajosas!
A casa assustava-me!
Era esquisita e sem harmonia
Não era o que meu coração pedia!
Desolada, eu rondava o terreiro
e agarrava-me ao cipó ,
desatando outro nó.
Era o possível
Era a sobra, depois das tantas batalhas perdidas,
Depois da alma tão ferida!
Eu segurava-me nos cipós.
Mangas arregaçadas
O quintal é o meu chamariz
Muitas plantas e árvores serão
a força motriz
Na ajuda de amar e aconchegar.
Foram galhos quase secos fincados
Sementes espalhadas e semeadas
Em latinhas, copinhos, potinhos ,
catadora dos lixos alheios.
Pneus velhos...os vasos
Latas velhas, o adorno
Garrafas Pet, recicladas
As ternuras armazenadas
A alegria das formaturas
A festa das pequenas conquistas
A vida recomeçando
A brotação esverdeando
Os cipós me segurando.
Sentimentos harmonizados
Os sorrisos já exibidos
As consciências, feito uma pluma.
Os eixos reapertados
As esperanças despertadas
Fluiu
Brotou
Consertou
Amou
Reiniciou
Firmou
Caminhou
Energizou
Comemorou
Brindou!!!
O primeiro gole do vinho tinto
depois da década
vivida a seco.
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MUITO AMÉM...
Vera Popoff
Envolvido o corpo numa aura pesada...
Gente com a dignidade roubada...
Muito Amém para a grande
carência de amor
Muito joelho dobrado, na missa
E nenhum pudor!

Energias putrefatas. Canalhas
vestem vidas com fúnebres mortalhas.
Afundam as ilusões da beleza
já vivida,
da fome combatida
da miséria combalida.
Defuntos nos rondam...
com a força bruta dos nefastos
que nos torturam e gargalham e
cospem sobre a nossa humilhação .
Nosso passo, agora, é de fasto,
numa estranha estrada encrudescida,
já pisada, tristemente, reconhecida.
O silêncio é lúgrube , enquanto
as consciências são devoradas
por insetos , pelas larvas.
Nosso mundo chora , incerto,
pendente de indignação,
assolado pela crueldade
d'alguns carcereiros,
vís justiceiros,
que perfilam e marcham ,
lambendo os coturnos,
carregando o odor do sangue
que em nome do anticrime
derramam .
A livre avenida
está camuflada
tristemente fantasiada
de verde oliva.
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SAIR DE CENA

SAIR DE CENA
Vera Popoff
Sair de cena , às vezes ,
faz parte do teatro da vida....
O texto da peça enfastiou-me!
O figurino esgarçou-se
A página amarelou
A voz emudeceu.

Tempo de cerzimentos,
reflexões e ponderações!
Momento para a solidão,
sabiamente , ela habitará o palco!
Os textos serão reescritos
com a fantasia do manuscrito!
Na reestréia ...a luz estará focada
A roupa bem costurada
A vontade , respeitada
A energia , com retoques mais
carregados!
O palco estará ampliado
No espaço redecorado,
novas óperas cantadas,
novas paixões deflagradas
e chuvas douradas... sobre
inéditas utopias e ilusões.
No centro do palco redefinido,
esperanças brotadas
e sementes de amor
lançadas !
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SOLIDÃO POVOADA

Solidão Povoada
Vera Popoff
A solidão é ampla.
Tem atalhos que percorro...
sempre, sempre ...só.
Tantas vezes, olham-me com dó!
Tolos, tenho a alma povoada

O coração com muitos compartimentos
Onde vivem a saudade boa,
A coragem de viver à toa,
Lembranças tatuadas
Histórias bem e mal contadas
Poucas verdades e mentiras gostosas de ouvir.
"Causos" , muitos causos.
Sou guardadora compulsiva
de causos ouvidos
lidos e relidos, contados pelas
comadres, compadres e padres.
Causos das avós, do pai,
um brilhante contador de causos.
Caminho cedo, quase na madrugada
Encontro pessoas boas
As ruins, mando procurar
aquele mau lugar!
Três bichanos aguardam a comida
Levo na bolsa de pano que carrego
Sem folgar os passos
Um dever do qual o pé, eu não arredo!
O Nego, cão da rua
Enche-me de carinho
Abana o rabinho
E faço-lhe um afago
Dou -lhe grãos de ração ,
sua recompensa
Sistemático, mas livre!
Faz o que quer,
quando quer.
Nos alheios jardins, onde passo
Controlo a floração
Toco as flores com doce olhar
Com receio de as machucar!
Medito. O que é meditar?
Não tive esta aula, mas posso
imaginar
inventar
Intuir
sem falar.
Dou um drible na dor!
Ela leva um chapéu
Uma finta e dá um tempo !
Saio da marcação
e descontraída, memorizo
uma poesia ou canção!
Solidão povoada!
É mesmo, uma solidão arretada.
Joga com as palavras, mas
destrata o conceito e a ideia formada.
Aceita o sim e o não
Tem ojeriza ao talvez!
Talvez, sim?
Talvez, não?
É conversa que fica em cima
de muro.
Mal suporto uma cerca ou porteira
Muros? Só os derrubados.
Alma murada é alma confinada
Não voa, não corre , não viaja
Daí, a solidão perde o encanto
de ser a solidão povoada!

domingo, 7 de abril de 2019

PLANTA BAIXA E VISÃO OBLÍQUA

PLANTA BAIXA E VISÃO OBLÍQUA
                                               Vera Popoff

A geografia judia...
Provas e estudos , leituras
Tudo tão distante de mim!
A cabeça gira por todos os lados
Ah...só desejo pisar num chão seguro
Abrir o meu coração mansinho
como um porto de carinho.

Dá um nó , enxergo embolado
Fico desorientado
tanta visão explicada!
Paralela, vertical e  horizontal
Na visão oblíqua, enxergo de cima
          e meio de lado
Só desejo enxergar a vida
            com amor
Já chega de  insegurança e dor.

Desenhei a planta baixa
Primeiro na minha alma
Depois na folha branquinha
O meu quarto abrigador
A  cozinha , a sala e a  varanda
Onde danço a minha ciranda.

N a reta , na curva ou na paralela
Pedalo a minha bicicleta no espaço
        do meu quintal
Para mim, um espaço sem igual
Na Mooca, dentro da capital,
no estado de São Paulo
Um pedaço do Brasil
Mas olho  para cima e só enxergo
nuvens brancas num céu azul anil.